Boletim n. 316 - junho/2025
- ASSAN 2025
- 10 de jun.
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No rastro da continuidade?
Em reunião com a diretoria da Assan ocorrida em fevereiro, no início de sua gestão, Monica Lima enfatizou sua intenção de trabalhar em diálogo e se comprometeu com o fortalecimento do Arquivo Nacional (AN) e com os princípios governamentais da democracia e da transparência. Nessa e em outra reunião, que contou com a presença da ministra Esther Dweck, foram abordadas questões como plano de carreira, revisão do decreto n. 10.148/2019, enfraquecimento do AN face ao crescente papel do ColaboraGov referente à gestão de documentos, reestruturação administrativa, requalificação da sede e da Superintendência Regional de Brasília, e assédio moral.
Os entraves ao diálogo pretendido logo se apresentaram. E-mails enviados pela diretoria da Assan em fevereiro e março, solicitando a minuta da revisão do decreto n. 10.148; o acesso ao processo SEI referente à gestão de documentos no âmbito da Secretaria de Serviços Compartilhados (SSC) e a respectiva nota técnica elaborada pelos servidores da DGD; e o projeto de requalificação do AN, conforme pactuado nessas reuniões, não tiveram qualquer resposta. Ainda que a justificativa do pouco tempo para recomposição do gabinete da direção-geral pudesse ser utilizada, a ausência de uma mera confirmação de recebimento de e-mail institucional, ainda o meio oficial de comunicação administrativa dos órgãos públicos, não é uma prática, digamos, adequada. Assinala-se, no entanto, que isso não é incomum no âmbito do órgão. Após recebermos o convite da Secretaria-Executiva do Conarq para integrar a Comissão Organizadora Nacional da II Conferência Nacional de Arquivos (CNARQ), indicamos, no final de março, os nomes de duas representantes (titular e suplente), que até agora não sabemos se foram aceitos, dada a ausência de resposta.
Sobre o fortalecimento do Arquivo Nacional pretendido pela direção-geral, restam dúvidas, porque ainda não foi apresentado para o corpo de servidores seu projeto político-institucional, conforme solicitado pela Assan nas reuniões citadas. A então nova diretora-geral informou que iria se reunir com as diferentes equipes técnicas do Arquivo Nacional, no que a associação sugeriu uma reunião geral com todos os servidores no auditório, o que não foi feito de nenhuma forma. Por outro lado, a permanência de grande parte do corpo diretivo aponta para um cenário de continuidade. Apenas André Cavotti, da Diretoria de Gestão Interna (DGI), e Jean Camoleze, da Diretoria de Gestão de Documentos (DGD), foram exonerados, o primeiro a pedido. A DGD foi assumida pela substituta de Camoleze, Paola Bittencourt, e as coordenações-gerais que estavam ou ficaram vagas, como a Coordenação-Geral de Acesso e Difusão (Coace/DPT) e a Coordenação-Geral de Gestão de Documentos (Coged/DGD), foram assumidas pelos substitutos. A DGI foi assumida por Luis Carlos Alves Colonezi Silva, como substituto, e na Coordenação-Geral de Processamento Técnico e Preservação (Copra) ainda existe certa indefinição, sendo que a antiga titular, Sheila Muller, foi alçada à diretoria-adjunta.
Nesses quatro meses, observamos ações importantes, como a da revisão do decreto n. 10.148/2019, que, a despeito das críticas feitas pela Assan, representa um ponto positivo para dar início à recuperação do papel do Arquivo Nacional no âmbito da administração pública. Tal iniciativa, no entanto, não foi divulgada institucionalmente, cabendo à Assan disponibilizar o número do processo SEI e, depois, a minuta do decreto, para que os servidores e a sociedade civil tivessem conhecimento. No momento, não temos informações de como este processo tramita no Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos (MGI). Além dessa medida, houve a retomada de alguns projetos e a busca por reconfigurar eventos que haviam sido modificados na gestão anterior, como o Festival Arquivo em Cartaz, com o retorno da Mostra Competitiva, por exemplo.
Em relação à transparência, a agenda pública da direção-geral continua não sendo totalmente preenchida. Na prática, tomamos conhecimento dos compromissos oficiais da direção-geral e do corpo diretivo apenas pelas redes sociais, que não podem ser o veículo oficial de comunicação com os servidores e a sociedade. Observamos ainda a permanência do silêncio sobre o avanço do ColaboraGov nas atividades de gestão de documentos da administração pública federal. E outros assuntos, como o projeto de requalificação do Arquivo Nacional e a reestruturação administrativa, mantêm-se desconhecidos do corpo de servidores. Além disso, segue parado no MGI o processo que trata da revogação da atual política de aquisição de acervos privados, implementada durante o governo Bolsonaro.
Assistimos também à persistente falta de critérios para a concessão de passagens. Enquanto têm sido negadas solicitações de servidores para participação em eventos importantes de qualificação, sob a justificativa de “restrição nas emissões de passagens provenientes da falta de saldo do referido contrato”, acompanhamos, semanalmente, as viagens feitas pela direção-geral e corpo diretivo pelo Brasil e pelo mundo, quase sempre contando com mais de um representante no mesmo evento. Além disso, causa-nos grande estranhamento ver membros do corpo diretivo participando de mesas sobre assuntos completamente alheios às suas atividades e à sua formação, mesmo havendo especialistas na instituição, assim como a falta de critérios para distribuição desses recursos entre o restante dos servidores – a maioria. Isso sem contar, como lembrou o Giro da Arquivo, um importante boletim informativo da área de arquivologia, a falta de clareza sobre os custos dessas viagens, já que o AN perdeu sua autonomia financeira e esses registros aparecem vinculados ao MGI.
Enfim, sabemos que o esforço de reconstrução do AN está longe de ser uma tarefa fácil, mas acreditamos que só a partir da conjugação dos esforços de todos em uma direção bem definida, pautada concretamente pelos valores da democracia e da transparência, e por um projeto político-institucional claro, avançaremos nesse processo de transformação. Sem isso, continuaremos assistindo à instituição perder cada vez mais seu protagonismo e seu papel na administração pública e na sociedade.
Reunião com a direção-geral
No dia 9 de maio, fizemos uma nova solicitação de reunião. O recebimento do e-mail foi confirmado no dia 19, mas o encontro ainda não foi agendado. Essa reunião, cujo conteúdo seria tratado neste boletim, tinha como pauta obter informações sobre plano de carreira e sobre a reforma administrativa discutida no MGI, considerando seu impacto no Arquivo Nacional; o projeto de requalificação do Arquivo Nacional; a reestruturação administrativa em curso no Arquivo Nacional; e as ações de combate ao assédio moral realizadas pela direção-geral, além de reforçar a solicitação de apresentação do projeto político-institucional da direção-geral para o corpo de servidores do Arquivo Nacional. Ainda estamos aguardando.
E a reconstrução do Memórias Reveladas?
Nesse rápido balanço dos quatro meses da gestão de Monica Lima, não podemos deixar de dedicar um espaço especial para, mais uma vez, tratar da situação do Memórias Reveladas. A área, que foi fragilizada durante o governo de Jair Bolsonaro, ainda não se recuperou do desmonte sofrido. Embora a reorganização do Memórias Reveladas conste como uma ação do Planejamento Estratégico Institucional (PEI) 2024-2027 e tenha sido mencionada pela diretora-geral na Semana Memórias Abertas promovida pelo AN, o que ainda se observa é a manutenção de uma área distanciada de seu projeto original, centrado na localização e no tratamento de arquivos referentes ao período ditatorial, de forma a esclarecer acontecimentos históricos e contribuir para ações pautadas por memória, justiça e reparação. O AN vem optando por atribuir ao MR um papel reduzido, voltado mais para ações de difusão, como pode ser acompanhado pelas redes sociais divulgadas pelo próprio setor. Mais grave foi a saída de dois servidores de carreira, sob denúncia de assédio, como relatamos no boletim anterior, cujos desdobramentos e apuração, por parte da direção-geral, desconhecemos.
Igualmente desconhecido é o Plano de Articulação Institucional para o Centro de Referência das Lutas Políticas no Brasil – Memórias Reveladas, que foi elaborado por um grupo de trabalho criado pela portaria MGI n. 3.072, de 8 de maio de 2024, cujo prazo de execução de seis meses foi ampliado para oito pela portaria MGI n. 9.615, de 17 de dezembro de 2024.
Como ocorreu na gestão anterior, vemos o investimento na realização de eventos destinados a difundir o próprio MR, e não em ações efetivas de um centro de referência voltado à localização e difusão de acervos. Em março, foi realizada a Semana Memórias Abertas, ocasião em que os vencedores do prêmio de pesquisa foram homenageados e também vimos surgir novas narrativas e ‘mitos fundadores’ do Memórias Reveladas, dotados de uma perspectiva bastante personalista, que apagou a contribuição dos diferentes servidores, tanto dos que participaram das discussões iniciais desse projeto, antes mesmo de se constituir como uma unidade administrativa, como daqueles que atuaram na área ao longo dos anos, muitos dos quais resistiram e foram duramente atacados durante as gestões anteriores.
A chegada de novos servidores para o setor e até a existência de uma residência de capacitação no MR, sobre a qual nada sabemos, seria algo a se comemorar, mas, sem projeto político, o papel e os horizontes futuros do Memórias Reveladas permanecerão reduzidos e descaracterizados da proposta original, transformando-o em mais um projeto de difusão cultural.
Pela regulamentação da lei n. 14.846/24!
A lei n. 14.846, de 24 de abril de 2024, promoveu uma alteração na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), para atribuir medida especial de proteção aos trabalhadores de arquivos, bibliotecas, museus e centros de documentação e memória, cujas atividades os deixem expostos ao contato com agentes patogênicos. Passado mais de um ano, esse dispositivo ainda aguarda regulamentação.
Cabe ao Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) estabelecer as disposições complementares, tendo em vista as peculiaridades de cada atividade ou setor de trabalho, para que os efeitos da lei, inclusive o pagamento de adicionais, sejam efetivados. Várias entidades e grupos vêm juntando esforços para acelerar esse processo. Em julho do ano passado, representantes do Conselho Federal de Biblioteconomia (CFB) participaram de uma reunião com diretores da Secretaria de Inspeção do Trabalho do MTE para tratar do tema. Na ocasião, foi assinalada a necessidade de cumprimento de uma série de etapas para a concretização do processo de alteração normativa. O assunto também foi abordado no Giro da Arquivo, em sua edição n. 305, de novembro de 2024. A Assan considera esta pauta de grande importância para os trabalhadores dessas instituições e reforça a necessidade de atenção das autoridades públicas para que o processo de alteração normativa seja conduzido da forma mais breve possível.
Assédio moral: seu uso como estratégia administrativa continua
Como tratamos no boletim anterior, a prática de assédio moral no Arquivo Nacional não é nova, mas se tornou corriqueira nos últimos anos, persistindo até hoje. Após a matéria publicada pela Assan, alguns colegas nos procuraram para falar de casos ocorridos e até mesmo prints de conversas via WhatsApp chegaram ao nosso conhecimento. O que se observa, portanto, é que há, por parte de algumas chefias, a confiança de que nada vai acontecer, o que não as inibe de deixar registros de suas condutas inadequadas.
No ano passado, o decreto n. 12.122, de 30 de julho, estabeleceu um programa para o tratamento do assédio moral e da discriminação no âmbito da administração pública federal, com a finalidade de enfrentar todas as formas de violência decorrentes das relações de trabalho. Em setembro de 2024, foi aprovada a portaria MGI n. 6.719, que instituiu o Plano Federal de Prevenção e Enfrentamento do Assédio e da Discriminação na Administração Pública Federal Direta, suas Autarquias e Fundações. Nessa portaria podem ser encontradas as diretrizes, ferramentas de prevenção, acolhimento, denúncias e proteção à pessoa denunciante. Partindo dessas diretrizes, o MGI elaborou seu Plano Setorial de Prevenção e Enfrentamento do Assédio e da Discriminação, publicado este ano.
No final do mês passado, o MGI divulgou a criação de um Serviço de Suporte Psicossocial, voltado aos servidores da própria pasta e dos órgãos que integram o Centro de Serviços Compartilhados – ColaboraGov, que reúne outros 12 ministérios. O público-alvo são os servidores que “enfrentam situações de sobrecarga, estresse, tensão no ambiente de trabalho ou na vida pessoal, bem como outras dificuldades emocionais, sejam de origem pessoal ou profissional”. Ainda que a matéria não mencione a expressão assédio moral e o escopo do serviço inclua questões de esfera pessoal, o estabelecimento desta estrutura pelo MGI é bastante sintomático e alerta para o impacto, não apenas individual, dos problemas enfrentados no ambiente de trabalho.
Tratando mais diretamente do Arquivo Nacional, no plano setorial do MGI constam as ações que devem ser executadas pelo órgão e seus prazos. A gravidade da questão exige, no entanto, maior rapidez. Além da reunião com a Assan e servidores do Memórias Reveladas, que foi considerada pelo corpo diretivo como uma ‘ação de escuta e acolhimento’, não vimos uma movimentação efetiva, nem mesmo algo de pequeno impacto, mas importante, como a divulgação institucional dos instrumentos existentes, como a Cartilha Lilás ou mesmo o plano setorial elaborado pela pasta ao qual está subordinado. É preciso que a direção-geral se comprometa a atuar não apenas no acolhimento a servidores assediados, mas sobretudo junto às chefias, de forma a impedir a continuidade dessa prática. É preciso falar sobre condutas inadequadas nas relações de trabalho, fazer o letramento de chefias e servidores sobre o que pode ser configurado como assédio moral, acompanhar as denúncias, entre outras medidas, para coibir que práticas nocivas afetem os trabalhadores e a administração pública.
Para saber mais: A Escola Nacional de Administração Pública (Enap) oferece o curso gratuito Assédio moral: o que saber e fazer. A capacitação permite entender melhor o que é assédio moral e conta com exemplos que auxiliam os servidores a identificarem casos que podem afetá-los ou aos seus colegas.
A chegada dos novos servidores concursados
A Assan parabeniza e dá boas-vindas aos servidores e servidoras recém-chegados ao Arquivo Nacional.
No dia 18, faremos uma atividade para falar um pouco sobre as lutas da Assan, em especial pelo plano de carreira, e a importância da união dos trabalhadores para a garantia de seus direitos e a defesa da instituição.
Sabemos que as poucas vagas destinadas ao Arquivo Nacional não são capazes de suprir a carência de quadros da instituição e reforçamos a necessidade do comprometimento da direção-geral para que o quantitativo de vagas seja ampliado no período de vigência desse concurso e para que outros sejam viabilizados pelo MGI. Por outro lado, mesmo com o baixo número de vagas, não houve uma discussão sobre a distribuição dos novos servidores e algumas áreas foram surpreendidas com a chegada de pessoal, sem terem sido avisadas com a devida antecedência. Parece que não houve um planejamento mínimo de algo previsto há mais de um ano…
Descontos de gratificações para fins previdenciários
A pedido de alguns servidores, a Assan fez uma consulta à Coordenação de Gestão de Pessoas (Cogep) a respeito da possibilidade de se optar pelo desconto sobre a GSISTE e outras gratificações, como a FCE, para fins previdenciários. De acordo com a resposta, é possível contribuir sobre GSISTE e FCE, podendo o servidor selecionar a opção Minha previdência, Incluir/alterar rubricas no SouGov.
Para mais informações, sugerimos que os servidores entrem em contato com a Cogep.
Vem aí a Festa Junina, ou melhor, Agostina, da Assan!
Neste ano, nossa festa será realizada no dia 8 de agosto. Interessados em inscrever suas barracas, enviem e-mail para assan2007@gmail.com.
Fatima Taranto
Eu me sinto muito lisonjeada, acho legal. Ao mesmo tempo, fico envergonhada. É muito esquisito. Espero realmente representar essas mulheres que trabalham na cadeia do audiovisual.
Fátima Taranto, sobre ser homenageada pelo festival Arquivo em Cartaz, 2019
No dia 21 de maio de 2025, nós perdemos uma pessoa querida e uma profissional ímpar. Fátima Taranto faleceu em decorrência de uma pneumonia e deixou familiares, amigos e colegas de coração partido. Profissional crucial na conservação audiovisual em nosso país, Fátima veio para o Arquivo Nacional em 2006, do CTAV, e ficou à frente do setor de conservação de filmes por quase duas décadas. Foi uma das fundadoras da Associação Brasileira de Preservação Audiovisual (ABPA), também trabalhou na Embrafilme e na Fundação do Cinema Brasileiro. Ministrou e coordenou inúmeras oficinas técnicas (no Recine, no festival Arquivo em Cartaz e em outros eventos e instituições) e treinou vários servidores do Arquivo Nacional que passaram pela conservação de filmes. Cineclubista e cinéfila de carteirinha, a dedicação de Fátima à preservação da nossa memória em película deixou marcas profundas e agora, um grande vazio. Era fã dos filmes Macunaíma, Amuleto de Ogum, Lira do delírio. Pulava Carnaval, dançava forró, cuidava de Tiquinho – o Gato e curtia muito viajar.
Fátima, mãe do Lucas, amiga de um monte, mestre de outro tanto, homenageada do Arquivo em Cartaz 2019, você partiu cedo demais. Mas também, sempre seria cedo.
A Cinemateca do Museu de Arte Moderna exibirá Macunaíma em sessão-homenagem à Fátima, dia 12 de junho, às 15 horas.
É uma paixão. Uma missão. É tudo misturado. Tem o fato de gostar muito de cinema. Quando estou agoniada, ir para a mesa de revisão analisar um rolo de filme me acalma. Entrar em uma sala de cinema também.
Fátima Taranto, sobre sobre seu trabalho com preservação de filmes
Trechos retirados de entrevista concedida a Antônio Laurindo e Mariana Monteiro, publicada na revista Arquivo em Cartaz, em 2019.
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